Andrea Machado - Não há turismo de excelência sem soberania alimentar
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Entre os perfumes da Roça das Mangueiras e o calor do Pululukwa, Angola revela o seu encanto turístico. Mas sob a beleza dos sorrisos e paisagens, esconde-se uma fragilidade estrutural: a dependência alimentar externa que limita uma hotelaria verdadeiramente sustentável.
Num país com terras férteis e clima generoso, é inaceitável que hortaliças sejam importadas e que o peixe servido tenha viajado mais do que o hóspede. A sustentabilidade alimentar não é um luxo: é uma questão de soberania, saúde e identidade cultural. Como criar experiências locais se os ingredientes não o são?
O sector turístico pode e deve ser agente de transformação. Valorizando produtos sazonais, investindo em hortas comunitárias e fortalecendo cadeias curtas de abastecimento, é possível garantir frescura, autenticidade e desenvolvimento rural. Há bons exemplos: chefs que reinventam pratos com banana-pão ou cooperativas que fornecem peixe local a hotéis. Mas falta escala, logística e visão.
A ausência de infraestrutura de conservação como sistemas de frio compromete todo o esforço agrícola, gerando desperdício num país onde ainda há fome. Importar, além de dispendioso, fragiliza a economia e rouba à mesa angolana os seus sabores mais genuínos.
É hora de criar um pacto nacional pela gastronomia sustentável. De unir Governo, hotéis, produtores e universidades. De garantir que os alimentos que servimos nas nossas ementas sejam, com orgulho, de Angola.
Porque não há turismo de excelência sem soberania alimentar. E não há futuro que se construa de barriga vazia.
Andrea Machado, Directora Executiva do Grupo Cosal