É artista plástico e jornalista, e a sua atividade divide-se entre o cartoon e a pintura. António Maria de Almeida Calado da Maia nasceu em Rio Maior, em 1951. Quiseram as voltas da vida que, depois de ter frequentado três cursos superiores, o talento para o desenho e a pintura herdado da mãe falasse mais alto, assim como o seu «inflamado espírito crítico». Um espírito irónico e calado, tal como um dos seus apelidos, mas que materializa em cartoons e que é, afinal, um brado bem audível, «um tiro certeiro no alvo», pondo a nu as fragilidades da sociedade. Começou a publicar cartoons em 1978 no semanário Edição Especial, mas outras colaborações se seguiram com os jornais Tempo, A Tribuna, Expresso, o Semanário, A Capital, o jornal 24 Horas e as revistas Fortuna e Villas&Golfe, entre outros. Atualmente publica cartoons no Correio da Manhã. Ainda que António Maia transfira o humor para a ponta de uma caneta, ao qual adiciona ironia, sarcasmo, criatividade e um conhecimento do mundo que o rodeia, ele não o esgota, tal como testemunhamos nas palavras que se seguem. Tem feito muitas exposições individuais e coletivas, tanto de cartoons como de pintura, em Portugal e no estrangeiro, e já ganhou inúmeros prémios. São mais de 40 anos a fazer da «ironia a melhor arma». Aliás, também a pintura «por vezes, descai, pecadora, para o humor e crítica social». Gil Vicente haveria de concordar!
Estudou Direito, Sociologia e História da Arte. Que voltas lhe deu a vida, ou o António deu à vida, para chegar ao mundo dos cartoons?
Na verdade, frequentei três cursos universitários. A meio de Sociologia, o serviço militar, a Revolução e os tempos agitados mudaram tudo. Depois a insatisfação, novos tempos, novas políticas e visões fizeram o resto. Até que o jeito para o desenho e um inflamado espírito crítico levaram-me às redações de jornais. Aí descobri como utilizá-los de forma jornalística e artística. A vida dá, sem avisar, as voltas que lhe apetece.
Tem alguma formação em artes, ou é autodidata?
Sou autodidata. Herdei de minha mãe o talento para o desenho e para a pintura.
Vivemos momentos – políticos, sociais, etc. – o suficientemente conturbados para o inspirarem a criar cartoons?
Os nossos políticos e outros atores sociais têm sido de uma generosidade comovente para com este pasmado cartoonista. Um país governado, há décadas, por formidáveis medíocres e extraordinários incompetentes, que nos levaram a todas as dificuldades possíveis e imaginárias, é sempre uma fonte de inspiração. Como alguém dizia, os homens nascem livres e iguais. Só que, depois, há os que vão para a política.
«Um país governado, há décadas, por formidáveis medíocres e extraordinários incompetentes (…), é sempre uma fonte de inspiração»
Há alguma figura ‘apetecível’ que ainda não tenha retratado?
Há muitas figuras apetecíveis para retratar. Só que, como o cartoon, por assim dizer, vai ‘eternizar’ os políticos visados, alguns não são suficientemente bons, maus, corruptos, ativos, etc., para merecerem um cartoon...!
Já alguma vez foi censurado ou processado? Se sim, quer contar-nos por que razão?
Nunca fui censurado ou processado. Recebi vários ‘recados’ e não passou disso. Penso, aliás, ao contrário do que se julga, que o cartoon deve ser um tiro certeiro no alvo, de tal maneira que o visado não tenha hipótese de ripostar. E, para isso, a ironia é a melhor arma. Não o insulto, o ataque pessoal.
Há algum tema que ainda seja ‘proibido’ em Portugal? E noutras geografias?
Em Portugal, julgo que já não existem temas tabus, proibidos, inabordáveis. A democracia e a liberdade de expressão são as culpadas. Nós e grande parte do mundo ocidental somos a exceção. Em grande parte do mundo que vive com fanatismos religiosos, em ditaduras, teocracias ou pseudo-democracias, esta liberdade de crítica não existe. Há cartoonistas, mas condenados a louvar o regime e a atacar os ‘inimigos’ do mesmo.