Formou-se em arquitetura. Desde que iniciou a sua atividade, até aos dias de hoje, como tem sido o desafio?
Desde que me formei em arquitetura, e após breves experiências por outros ateliers, que trabalho em projetos dos quais sou autor. Já são mais de 30 anos de uma atividade contínua e intensa, com uma considerável obra construída. Quando me formei, o mundo dos projetos de «arquitetura» era dominado por engenheiros, desenhadores e outros curiosos. Aos arquitetos, cabia uma pequena fatia dos projetos. Diziam que os arquitetos eram caros, chatos e teimosos. Por isso, para quem queria fazer arquitetura, não foi fácil começar nesse contexto, tendo ainda de ultrapassar outros obstáculos. Mesmo assim, não me queixo. As dificuldades tornam-nos mais resistentes. Apesar de a nossa obra hoje ter um reconhecimento crescente, nem sempre foi tão apreciada, nem pelas pessoas, nem pelas entidades, nem pela comunicação social, que reagiam mais negativamente a uma arquitetura contemporânea e depurada. Na altura, ficava triste e magoado. Hoje, já aceito e compreendo a divergência de opiniões e que exista uma certa resistência à novidade. Aliás, sempre assim foi. Os ‘velhos do Restelo’ fazem parte da nossa história.
Grande parte dos seus projetos situa-se no Algarve, de onde é natural. Falamos de uma das regiões do país onde a imobiliária de luxo se evidencia mais. Quão desafiante tem sido desenvolver projetos a esta escala?
Trabalho para diferentes segmentos de mercado, mas também para diferentes escalas e sítios. Mas, de uma forma natural, têm vindo a surgir oportunidades para trabalhar em diversos empreendimentos e habitações unifamiliares, onde nos têm sido dadas condições para realizar projetos de qualidade, feitos com rigor e grande dedicação, o que deveria ser normal na nossa profissão. Nos projetos de habitação unifamiliar, o maior desafio é a satisfação dos nossos clientes e das suas expetativas, sendo a maior destas a concretização do seu sonho. É um processo muito personalizado, que implica uma vasta equipa de trabalho e o envolvimento direto do cliente, desde a primeira conversa até ao final da obra. O cliente acaba por tornar-se parte da equipa de projeto e, normalmente, fá-lo com grande satisfação e entusiasmo. No final da obra, sinto sempre um misto de orgulho e insatisfação... ficando com a sensação de que algo poderia ser melhorado. É aquela inocente e incessante busca da perfeição que nos faz acreditar e trabalhar apaixonadamente para criar melhores lugares e fazer pessoas mais felizes. Mas o melhor de tudo é, após a construção, ver aquele brilho nos olhos dos nossos clientes, que nos transmite a sinceridade do seu apreço pelo nosso trabalho e nos tranquiliza, porque vamos passar a nossa arquitetura para uma nova fase: para ser vivida. Eles vão dar continuidade ao processo, ajustando-se ao edifício e ajustando o edifício a eles. Para que vivam e envelheçam bem. Eles e o edifício. E, assim, fez sentido o nosso trabalho.
Olhando para o mercado imobiliário e da construção atual, consegue identificar que região terá um maior potencial de crescimento em Portugal nos próximos anos?
As regiões com maior potencial de crescimento são as que atualmente já crescem mais. O crescimento atrai mais crescimento, assistindo-se a maiores assimetrias. Esse crescimento vai pressionar as zonas de maior atratividade do litoral e, consequentemente, provocar uma desertificação do restante território. O que nos trará graves problemas no ordenamento do território e na gestão dos recursos.
Precisamos, não de crescimento, mas de desenvolvimento. Desenvolver de forma equilibrada, no tempo e no espaço, com respeito pelos sítios e pelas pessoas. O que dificilmente acontecerá sem a existência de uma estratégia, de um rumo, de propósito a médio e longo prazo. Isso tem de partir de quem decide. E o que acontece é que quem nos governa e nos tem governado fá-lo de forma avulsa, desconexa e simplista para resolver as agendas políticas e eleitorais.
Tome-se como exemplo: enquanto usa o alojamento local como bode expiatório, o governo mostra-se convenientemente preocupado com o custo da habitação. No entanto, obriga todos os municípios a eliminar as suas áreas urbanizáveis dos seus PDMs, até final de 2023. Ora, a redução das áreas urbanizáveis irá traduzir-se numa menor oferta, com o aumento do custo dos solos e, consequentemente, do custo da habitação. Trata-se de mais uma medida vazia, para responder aos progressivos protestos pelos custos e falta de habitação. Mas conseguir-se-á reduzir o custo da habitação pela redução da oferta? Julgo que não.
Este grave problema da habitação não é pontual, nem circunstancial, mas resultado de um enquadramento mais vasto, que não se esgota em Portugal. Daí que importe definir uma estratégia adequada, ao nível das dinâmicas das populações, migrações, acessibilidades e ordenamento do território, para que se desenvolvam as regiões, cidades e lugares de forma mais equilibrada e justa. Se não houver habitação mais ou menos digna para todos, não haverá desenvolvimento para ninguém. Mas que seja feito numa economia de mercado aberta e nunca coerciva, sustentada no investimento, para criar o bem-estar de todos.
«No final da obra, sinto sempre um misto de orgulho e insatisfação... ficando com a sensação de que algo poderia ser melhorado»