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· Economia&Negócios · · T. Maria Amélia Pires · F. Direitos Reservados

Helena Amaral Neto

«As marcas de luxo são os melhores exemplos de criação de valor»

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A grande maioria questiona-se sobre «o que é o Luxo?». Será um simples toque, um cheiro, a riqueza, um objeto, uma viagem ou até mesmo uma palavra o verdadeiro significado de luxo?! Por estas incertezas, quisemos conhecer de mais perto aquela que é a opinião de Helena Amaral Neto – uma das personalidades que mais bem tem transmitido o conceito de luxo. É licenciada em Economia pela Universidade Católica Portuguesa e Mestre em Finanças pela City University, em Londres. Depois de vários anos a trabalhar na banca de investimento; de projetar o inovador eco-design, com a marca Tela Bags; entre outros cargos que foi adquirindo ao longo da carreira, assumiu, em 2013, a coordenação dos cursos de gestão na área do Luxo no ISEG. Além de tudo isto, em 2017, criou a Luxulting – Luxury Consulting, uma empresa de consultadoria no setor do Luxo. Aqui, em entrevista, Helena dá-nos a conhecer as variantes do luxo: «conceito de luxo», «negócio do luxo» e «estratégia de luxo».  

De que forma, enquanto professora, transmite o verdadeiro significado do luxo? O luxo ensina-se? E o que é o luxo? Poderá o luxo estar no privilégio das pequenas coisas como: sair, fazer compras, uma amizade, comer, viajar...?
A palavra luxo desperta sempre interesse, uma vez que está conotada com um mundo de sonho e inspiração. Enquanto profissional focada neste mercado, é importante distinguir entre as várias áreas do luxo: conceito de luxo, negócio do luxo e estratégia de luxo. Luxo existe desde o princípio da humanidade, e tem vindo a evoluir com os valores da sociedade ao longo do tempo. O conceito de luxo é subjetivo, depende de inúmeros fatores – desde a cultura e religião, geografia e geração. Luxo para um avô americano é diferente de luxo para um jovem chinês. O avô pode preferir uma viagem de golfe com os amigos, em que valoriza as experiências ao longo da viagem, enquanto para o millennial chinês é mais importante comprar o modelo mais recente de sneakers da Gucci… e postar no Instagram! O negócio do luxo, que se traduz nas atividades das marcas de luxo, representa um setor muito interessante em termos de valor e de crescimento. Trata-se de um mercado com vendas anuais superiores a 1.2 triliões de euros, repartido por vários setores – desde o mercado automóvel, hospitality, acessórios e bens pessoais, jatos e yachts, cruzeiros, mobiliário, arte, até bebidas e fine food. Apesar de ser um mercado de nicho, conta com cerca de 350 milhões de consumidores, com produtos que incluem o batom Chanel a 30€ e o Lamborghini Urus por 300,000€. É um negócio que tem vindo a crescer nos últimos anos, e com excelentes perspetivas de crescimento, sobretudo devido ao boom do mercado chinês.
A estratégia de luxo é o modelo de criação de valor subjacente às marcas de luxo mais valiosas e duradouras. Representa uma total inversão das regras do marketing tradicional, e é a base estrutural de construção de brand equity ao longo do tempo. Enquanto professora e coordenadora dos cursos de gestão de luxo no ISEG, estou focada no conhecimento que podemos partilhar com os profissionais. Não só os que trabalham com as marcas de luxo que vêm aprofundar a sua experiência, mas sobretudo todas as pessoas que pretendem diferenciar o seu produto ou serviço. As marcas de luxo são os melhores exemplos de criação de valor, e uma excelente fonte de inspiração para qualquer marca em qualquer setor. Todas as marcas e empresas podem aprender com a gestão do luxo. A Apple não é uma marca de luxo, mas implementa muitas técnicas de uma estratégia de luxo – bem visível no design dos produtos, no controlo da distribuição, no rigor da comunicação, e na política de preços. Ou seja, qualquer marca pode aumentar o seu valor de diferenciação com os exemplos da gestão do luxo. Nos cursos executivos temos uma abordagem totalmente prática, focada na implementação dos conceitos ao negócio, nos mais variados setores e etapas – desde startups de vinho, a hoteleiros experientes, passando pelo retalho de moda até produtores da indústria têxtil. Todos podem aprender com o luxo e criar valor nos seus negócios.

«Luxo para um avô americano é diferente de luxo para um jovem chinês»

No mundo profissional, procura ensinar estratégias de comunicação do luxo, nas empresas com quem colabora. De que forma o faz? 
O meu trabalho enquanto consultora é muito variado, e totalmente personalizado consoante o projeto e a empresa. A base do trabalho desenvolvido é o conhecimento – desde gestão estratégica, marketing e comunicação, até formação e curadoria de conferências de luxo. O foco está em criar valor, e daí constituir as melhores equipas para cada projeto. Trabalho com setores variados – desde hotelaria, imobiliário, retalho, automóvel, até media e serviços – sempre focada no segmento luxo e premium.
Em termos de comunicação, o mais importante (e o mais difícil) para uma marca de luxo é assegurar a consistência da mensagem e imagem. A marca e o que representa é o que a torna única e aspiracional, e deve estar presente em todos os detalhes e touch points com o cliente – desde o logótipo, aos posts nas redes sociais e escolha de influencers à interação na venda online. Representa um trabalho contínuo focado na excelência e na visão da marca, e é isto que faz a diferença. Por isso é que as marcas de luxo de sucesso são poucas, mas muito valiosas!

E o que é que podemos considerar luxo em Portugal? Que futuro terá o segmento de luxo em Portugal e no mundo? 
O mercado de luxo global cresceu 5% em 2018. Os setores com maior crescimento foram os cruzeiros (7%), os acessórios e bens pessoais (6%), bebidas e fine food (6%) e fine art (6%). Foi um ano excecional, com records de vendas dos principais grupos, LVMH e Kering, donas das principais marcas de luxo. O motor deste crescimento são os millennials chineses, e representam uma fatia cada vez maior do consumo das marcas icónicas. Também a Europa e os Estados Unidos contribuíram para este crescimento, e as previsões são muito positivas para o setor.
Portugal atravessa uma época única, em que o mundo nos está a descobrir e este mundo procura cada vez mais o que temos como características intrínsecas e únicas. As nossas tradições, a História e as inúmeras histórias, a manufatura, a qualidade do trabalho dos artesãos, a criatividade, a cultura… e, claro, as pessoas, com a nossa famosa hospitalidade e autenticidade. Estes são valores cada vez mais desejados, sobretudo no universo do luxo. É muito visível no turismo e no imobiliário, em que nascem projetos extraordinários de norte a sul, e que posicionam Portugal na Rota do Luxo. Cabe-nos valorizar e proteger o que nos torna tão especiais, e focar claramente a qualidade da nossa oferta para assegurar a sustentabilidade a prazo. As estimativas para o mercado do luxo são muito animadoras. As consultoras estimam taxas de crescimento de 3 a 5% até 2025 para a maioria das categorias do mercado de luxo. Também em Portugal as perspetivas são positivas para este setor, em grande parte devido ao boom turístico e ao impacto do turismo de compras de luxo. Acredito em preservar, posicionar e promover Portugal como destino de luxo – destino de turismo e de investimento.

«Portugal atravessa uma época única, em que o mundo nos está a descobrir»

O que é que é fundamental numa estratégia de marketing de uma marca para que se torne numa marca de prestígio e de luxo? 
As marcas de luxo têm características que as distinguem de todas as outras, desde mass market a marcas premium. É este conjunto de fatores – exclusividade, intemporalidade, excelência (qualidade só não é suficiente) – que contribui para criar uma aura de sonho e de desejo em torno da marca. Outros fatores importantes são a história e a tradição, uma vez que transmitem os valores das marcas, enquanto alimentam o storytelling fundamental na comunicação atual. Também a customização dos produtos e serviços é importante, desde gravar as iniciais num saco de golfe até ao desenho de uma viagem exótica com todos os detalhes personalizados. O design e a beleza fazem parte dos códigos de estética de cada marca. E cada vez mais a inovação e criatividade são fatores críticos no luxo (e não só) – para manter as marcas contemporâneas e diferenciadas. Os clientes de luxo querem ser surpreendidos e inspirados, pelo que a inovação permanente é fundamental – e o maior desafio das marcas de luxo!

«Acredito em preservar, posicionar e promover Portugal como destino de luxo – destino de turismo e de investimento»

Há determinadas marcas que são verdadeiros ícones, pela sua intemporalidade. Essas marcas estão além do luxo? Terão elas um lugar cativo ou tudo pode mudar? Como é que uma grande marca também pode cair? 
Há muita confusão à volta do que é considerado luxo. Tal como vimos acima, as marcas de luxo têm características que as tornam especiais, incluindo a intemporalidade, o que nem sempre acontece com as marcas premium. Por exemplo, Mercedes e BMW são excelentes marcas automóveis no segmento premium. São comparáveis uma com a outra, apostam na funcionalidade dos seus carros (melhor performance, mais conforto, etc.). A Ferrari está noutro patamar, é um verdadeiro ícone do setor automóvel, incomparável, logo, verdadeira marca de luxo. Mas tudo pode mudar, e, no caso das marcas de luxo, muito rapidamente. O investimento para manter o status de luxo de uma marca é muito grande. O maior grupo de luxo do mundo, LVMH, dono de 75 marcas tais como Louis Vuitton, Don Perignon e Bulgari, investe em média 11% das vendas só em publicidade. A exigência é enorme para manter a consistência de luxo em todos os mercados e canais ao longo do tempo. Algumas marcas não resistem à pressão dos resultados de curto prazo exigidas pelos investidores, sobretudo as marcas cotadas em bolsa, e tomam decisões que geram resultados imediatos à custa do valor da marca. Um exemplo histórico é a Pierre Cardin, que foi uma das maiores marcas de alta costura francesa, mas que enveredou por um processo de licenciamento excessivo que acabou por destruir a marca. O maior valor no luxo está no brand value, que deve ser preservado e construído com consistência e com uma perspetiva de longo prazo.

«Enquanto consultora e professora, acredito no valor da marca acima do produto»

Na hora da compra é mais importante: a marca ou o produto? 
Enquanto consultora e professora, acredito no valor da marca acima do produto. Sobretudo num mercado onde a experiência de luxo tem um papel cada vez importante, o consumo não se resume simplesmente ao produto. Quem compra uma marca quer entrar no universo de valores da marca, e pertencer a uma comunidade que partilha este lifestyle, sobretudo nesta época de redes sociais em que o Instagram se tornou a maior montra do mundo.

T. Maria Amélia Pires
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