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Jorge Buescu

«Se nos tivéssemos atrasado[Covid-19], teria sido desastroso»

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Físico por formação e matemático por fascínio. Jorge Buescu, que é professor na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, ficou conhecido do grande público pelas suas análises, que alertavam para a evolução da doença do novo coronavírus. Para chegar às suas conclusões usou dois métodos: o fenomenológico e a matemática, com base nos Sistemas Dinâmicos – a sua especialidade –, usando alguns modelos aplicáveis, no tratamento das variáveis desta pandemia.

Quando começou a perceber que este vírus era exponencial?
A minha preocupação começa devido à minha preparação científica: a minha área de investigação é Equações Diferenciais e Sistemas Dinâmicos. E, devido a isso, comecei a seguir o surto, em Janeiro, através dos números da China, quando começámos a ter mais notícias. Percebi, logo, que não seria algo para se levar de ânimo leve.

Mas, a determinado momento, teve de refazer as contas?
Vi que tinha subestimado alguns parâmetros. Por exemplo, o vírus Ébola, que tem uma mortalidade muito grande, mata os hospedeiros e suicida-se. Aqui, temos um vírus com características epidemiológicas que fazem com que ele se propague e, de uma forma invisível. Há muitos assintomáticos e ele vai-se alastrando silenciosamente, quase sem se dar por isso. E, quando se começa a testar a população, ele já está muito espalhado. A propagação inicial, que é exponencial, é uma reacção em cadeia, como se fosse uma bomba nuclear a explodir, só que, em vez de ser em microssegundos, é em dias. É esta combinação de factores que torna este vírus tão explosivo.

«Comecei a seguir o surto, através dos números da China»

E esse facto provocou tantas mortes.
Esse foi um dos factores que também subestimei – a falência dos serviços de saúde. Como matemático, faço contas olhando só para os números. Imaginemos que 5% de infectados, num milhão, contrai a Covid-19 e vai para os cuidados intensivos... São 50 mil pessoas ao mesmo tempo. Nenhum sistema de saúde aguenta se a doença não for controlada.

Para si, em Portugal as medidas de prevenção foram a tempo?
Não tenho dúvidas nenhumas de que sim. Se nos tivéssemos atrasado teria sido desastroso. Era preciso agir e agir muito rapidamente. Desta vez, tivemos a grande vantagem do atraso, em relação à Europa, e conseguimos olhar para lá e perceber que isto era a tal bomba nuclear em câmara lenta. O vírus estava a propagar-se mesmo que não se estivesse a ver.

Depois de organizar os parâmetros, como construiu os seus gráficos?
Trabalhei com duas fórmulas. A primeira, fenomenológica, é pegar nos números da Direção-Geral da Saúde e trabalhá-los de forma a reconstituir aquilo que está a acontecer por trás, e isto é feito sem olhar a outros aspectos. Assumi que eles vinham numa caixa negra e que nem sabia a origem. A segunda abordagem, que também utilizei, é ter um modelo matemático, ter equações que descrevem diferenciais, que descrevem o sistema, e colocar lá os valores dos parâmetros que observamos e tentar prever o que vai acontecer de futuro. São duas perspectivas diferentes, uma delas é pegar nos números reais e olhar para trás e tentar olhar para a frente também, e, a segunda, é pegar nos valores que temos e colocá-los nas equações e tentar ver o que vai acontecer para a frente.

«A Matemática transporta-nos a um mundo diferente»

Em termos futuros, o que nos dizem os seus dados?
Em termos futuros, os meus dados dizem que tudo depende do que fizermos. Estamos bem, no sentido em que temos uma situação estável, conseguimos que os nossos serviços de saúde, em termos hospitalares, dessem conta do recado, fechamos todas as torneiras e válvulas de modo a conter a expansão e conseguimos estabilizar a situação. Eu diria que não temos margem de manobra, não podemos errar, se acontecer algum erro que seja pela prudência, se errarmos por excesso, atingiremos muito rapidamente o patamar da ruptura do sistema de saúde e aí será uma tragédia.

A sua vida é Matemática, o que é que esta ciência significa para si?
A Matemática transporta-nos a um mundo diferente.  Desde sempre, para mim, é uma enorme paixão. É como a arte, é como ir a uma ópera ou a uma grande exposição, em que somos, de repente, transportados para outro universo. Matemática não são números, são ideias, e é com ideias que trabalho. Mexer em ideias é pegar em objectos, que estão numa espécie de universo platónico, lá longe, num sítio ideal, e mentalmente virá-los ao contrário, do avesso, para ver como são, que propriedades têm, que consequências nos provocam e por aí. Fazer matemática é isto.

Cristina Freire
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