É natural de Moçambique.
Nasci em Moçambique. Estive
lá até aos 11 anos.
Que recordações guardou de
lá?
Boas, muito boas (risos). Nasci em
Vila Pery – atual Chimoio – e, aos três anos, fui viver para a Manica, que
ficava muito próxima da fronteira com a Rodésia. Fiz a escola até ao 1.º ano do
ciclo (agora é o 5.º ano). Vim para Portugal em 1974.
Alguma vez voltou a Moçambique?
Não. Mas gostava muito de
lá voltar, de mostrar à minha família onde é que estive.
Lembra-se de brincar com os
meninos de lá?
Lembro. Há muita coisa que
está, ainda, bem presente. Dá é uma tristeza ir ao Google tentar ver aquilo e
perceber que está muito estragado, que as ruas não têm alcatrão… Ao contrário
do passado. Era uma vila tipo Freixo, pequenina, mas que tinha tudo.
E depois veio para cá
(Freixo)...
Quando cheguei cá, eu e os
meus pais fomos para Lagoaça. E, ao entrar naquela aldeia, ao ver todas aquelas
casinhas baixinhas, todas em pedra, a minha reação foi muito má. Assim que
cheguei à entrada daquela aldeia, disse ao meu pai: «Eu não fico aqui!».
Hoje, já não pensa assim?
Não, nem pensar! Não
trocava isto por nada. Mas foi o choque, o contraste, não tinha nada a ver.
Depois, durante muito tempo, e ainda hoje, não falo muito da minha infância,
porque as pessoas não entendiam muito bem. Havia aquele estigma do «é
retornada…». Não sou retornada, seria refugiada, retornada não – porque eu
nasci lá –, mas eram todos apelidados assim, de ‘retornados’.
O que a levou a tirar o curso
de gestão?
Tive a influência, desde
miúda, em Moçambique, de uma senhora que trabalhava num banco. O meu pai
mandava-me ir ao banco, com os recados dele, e eu adorava ir. Trabalhavam lá
essencialmente homens e uma moça solteira que era a Luísa, e eu, não sei
porquê, olhava-a e imaginava-me ali, como ela. Lembro-me de uma noite o gerente
do banco, o senhor Ferreirinha, estar lá em casa (Moçambique) e eu lhe dizer:
«Quando for grande quero ir trabalhar para o banco como a Luísa», e o meu pai a
dizer que não, e eu a dizer que sim! Fartei-me de chorar porque o meu pai me
estava a contrariar.
Mesmo contrariando o seu pai,
seguiu gestão?
Fui bancária. Quando estava
em Freixo a dar aulas abriu um concurso para a Caixa Geral de Depósitos,
concorri e entrei. Fui seleccionada entre os 48 concorrentes.
Viu-se no papel da Luísa (do
banco em Moçambique)?
Sim, porque era a única
mulher ali no meio dos homens.
O que lhe dizia o seu pai?
O meu pai ficou muito
contente, porque eu cheguei onde queria e ele tinha um orgulho muito grande em
mim.
A Maria do Céu mostrou-lhe que
conseguiu...
Sim… (emociona-se).
Sai da área da banca para a
política...
Nunca me imaginei a chegar
à reforma sempre a fazer a mesma coisa. No entretanto, há alguns anos, numa
transição de mandatos, pensei no que ia acontecer «este presidente vai estragar
tudo». Porque até ali a Câmara tinha uma área financeira muito boa e, depois,
começou a dar-se cabo de tudo (o novo presidente). Começou a parte financeira
da Câmara a ficar muito mal, e agora a recuperação vai demorar muito tempo. Foi
esse estado, e a vontade em fazer, que me entusiasmou para a Política. Nas
eleições autárquicas de 2009, o candidato do PSD convidou-me a integrar a lista
à Câmara Municipal, embora eu não tivesse ligação partidária, e à época
estivesse do ‘outro lado’. Nestas circunstâncias, tive de tomar uma decisão,
mas sempre numa postura honesta quer para com quem me convidou, quer para com
os que integravam a lista a que pertenci. Fui perentória «Tenho um convite e
vou aceitar». Toda a gente me apoiou. Concorremos. Não ganhámos, e estive
quatro anos a fazer oposição.
E depois?
Depois candidatei-me a
Presidente da Câmara! O anterior candidato e Presidente da Concelhia informa-me
que não seria recandidato. Nesse contexto fui clara: «se não és, tu, sou eu!
Fui, e ganhei!»
E como é que tem sido a
experiência?
Tinha plena consciência do
estado em que estava a Câmara, mas entendia que tinha de fazer alguma coisa...
«Se alguém
quiser um sítio para descansar, para sair da cidade, é vir para Freixo de
Espada à Cinta»