Há quanto tempo pratica golfe?
Faz agora dois anos e meio que comecei
a jogar. O meu amigo Hernâni Teixeira andou muitos anos a tentar convencer-me,
mas eu achei sempre que não tinha vida para isso e confesso que via a
modalidade na televisão e não achava grande graça. Quando saí do Governo, ele
continuou a insistir comigo e houve um dia em que sucumbi à pressão (risos). É de facto um vício. Dos bons.
Que lições de vida se tiram do
golfe?
Em primeiro lugar, que as coisas
dependem muito de nós. Em segundo lugar, nem sempre correm bem, e portanto é
preciso conviver com a adversidade. E, em terceiro lugar, aprendemos que se
agora não correu bem da próxima vai correr melhor.
Considera-se um homem
ambicioso?
Se se definir ambição por se querer
fazer mais e melhor sempre, sim, nesse sentido sou ambicioso.
A vida tem correspondido às
suas expectativas?
Tem. Felizmente, chegando a esta fase
da minha vida, não considero que tenha razões de queixa. Sinto que tenho
conseguido evoluir, quer em termos pessoais, quer em termos profissionais e, no
geral, as coisas que tenho feito deixaram-me satisfeito. Mesmo em tempos
difíceis, em que nem tudo correu bem, em que eu gostaria que as coisas tivessem
corrido de outra maneira, procurei sempre dar o melhor de mim e fazer o melhor
possível, dadas as circunstâncias.
Ter de pedir ajuda financeira
para Portugal foi um desses momentos difíceis?
Sem dúvida, sem dúvida! Passámos
momentos de muita dificuldade. A conjuntura internacional era muito complicada.
A percepção de que o financiamento, quer do Estado, quer da Banca, se estava a
tornar cada vez mais difícil, na situação em que então vivíamos, aconselhava a
que não corrêssemos mais riscos. Não podíamos depender exclusivamente do
financiamento do mercado porque era muito difícil e daí a necessidade de termos
de solicitar ajuda a instituições internacionais, neste caso a nível europeu e
também ao FMI (Fundo Monetário Internacional). E, como pudemos ver
posteriormente, estas situações colocam sempre o país numa tutela externa que é
politicamente incómoda e que, de alguma forma, fere o nosso sentido de
soberania e de autonomia, do ponto de vista político e nacional. É sempre muito
gravoso e nunca é uma decisão fácil, daí que há sempre muita resistência a
tomar-se uma decisão dessas, porque é algo que só se decide in extremis.
Isso fez com que tivesse
algumas noites mal dormidas?
Sim, foram noites difíceis, sem
dúvida, muita ponderação, mas a decisão teve de ser tomada e não estou
arrependido. Estou convencido de que se o país não tivesse tomado aquela
decisão, na altura, hoje estaria numa situação bem mais complicada.
Como ficou a sua relação com
José Sócrates, depois disso?
Passou a ser uma relação distante. Na
altura, ele tinha a percepção das dificuldades e das implicações da decisão,
daí que tenha resistido. Não foi algo que lhe agradasse e que afectou a nossa
relação pessoal, que depois foi melhorando com o tempo. O tempo ajuda sempre a
ultrapassar e a olhar para as coisas de forma diferente. Mas já não falo com
ele há muito.
É alguém que stressa com
facilidade?
Sofro a pressão das situações, mas não
stresso. Tento manter a calma, não costumo perder a cabeça e tenho consciência
de que isso também não resolve. Os momentos complicados exigem muito de nós e
não é perdendo a compostura que contribuímos para resolver as coisas. Em
momentos difíceis, quando as pessoas que estão a trabalhar connosco sentem que,
quem lidera, começa a perder a cabeça, ficam afectadas. Portanto, nós temos de
dar um sinal de confiança, de ponderação, de que estamos sob controlo, e essa é
a melhor forma de elas poderem responder.
Mas José Sócrates é alguém que
tira as pessoas do sério?
Às vezes. (sorriso)
Ficou surpreendido com o
convite para ser Presidente Executivo do BIC Portugal? Porque decidiu aceitar?
Nunca deixa de ser uma surpresa.
Decidi aceitar porque é uma área de atividade com a qual tenho contactado, há
já muitos anos, quando fui secretário de Estado do Tesouro, quando estive na
CMVM (Comissão do Mercado de Valores Mobiliários), como ministro acompanhei
sempre a situação do sector financeiro, e em particular da Banca. Em segundo
lugar, porque acho que é um desafio interessante, por duas razões: primeiro,
porque se trata de uma instituição relativamente jovem no panorama do sistema
bancário português, por isso, tem ainda de fazer um esforço para ganhar o seu
espaço e para se afirmar; em segundo lugar, porque é um desafio que ocorre numa
conjuntura particularmente difícil para a banca em geral, como temos vindo a
ver. Portanto, não vai ser uma tarefa fácil, tenho consciência disso, mas
também já me habituei a enfrentar alguns cenários difíceis. O desafio, quer
pela instituição em si, quer pelo contexto que nos rodeia, vai exigir um
esforço muito grande em termos de trabalho de equipa. E eu espero ser capaz de
liderar a equipa que vai estar à frente do BIC.
Não vê nenhum conflito de
interesses pelo facto de ter tido um papel na nacionalização do BPN?
Não há qualquer conflito de
interesses, até porque eu nunca estive ligado à administração do banco, só tive
de tomar uma decisão política na altura, numa situação de grande dificuldade,
em particular do então BPN, que era um risco sério para a estabilidade do
sistema financeiro. Não fui eu o responsável pela alienação do BPN ao BIC. Não
estive envolvido neste processo, portanto, não sinto qualquer conflito de
interesses.
Porque é que, na altura, o
Governo se comprometeu a vender o BPN, num curto espaço de tempo, quando sabia
que tal iria ser difícil?
O que aconteceu foi termos a
preocupação de cumprir um compromisso que foi assumido. O BPN foi nacionalizado
para evitar o agravamento da situação financeira. Nós nacionalizámos para
rapidamente devolver o banco ao sector privado. Nem sempre é fácil fazer a venda de um
banco. Vender, e vender dentro do prazo, só para cumprirmos um calendário a que
nos auto-impomos, arriscando a fazer uma venda má, não faz sentido, e por isso
mesmo há que esperar por condições mais favoráveis para a alienação de uma
entidade financeira, como foi o caso do BPN e como é atualmente o caso do Novo
Banco.
Mas então porque se
comprometeram na altura?
É evidente que o BPN é nacionalizado,
mas não é para ficar no sector estatal, era o sinal político que se queria dar.
Nós não estávamos a entrar numa onda de nacionalizações em que o Estado ia
ficar com o sistema financeiro ao seu colo. Não. Daí a necessidade de se dizer:
nós nacionalizámos, mas vamos privatizar. O Estado não quer ser o dono da banca
e era esse sinal político que se queria dar.
«Espero
ser capaz de liderar a equipa que vai estar à frente do BIC»