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· Personalidade · · T. Filomena Abreu · F. ©PMC

FERNANDO TEIXEIRA DOS SANTOS

«Procurei sempre dar o melhor de mim e fazer o melhor possível»

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Calmo, cordial e espirituoso. Assim se mostrou Fernando Teixeira dos Santos, ex-Ministro das Finanças e atual Presidente Executivo do Banco BIC, numa entrevista feita pela fresca de uma manhã, que não tardou em revelar-se quente. Ao volante de um buggy, no campo de Golfe da Estela, na Póvoa de Varzim, conduziu, com calma, as palavras, a cada uma das respostas. Nas pausas, as tacadas eram firmes. Na conversa não houve assunto que rejeitasse. A nacionalização do BPN; o convite que aceitou recentemente no Banco BIC; o resgate financeiro a Portugal, do qual foi responsável em 2011; a paixão pela família e amigos, que afiança nada pode substituir; a relação distante com José Sócrates; as expectativas de vida; e a opinião sobre o atual Governo. Sem arrependimentos pelas decisões tomadas, falou dos momentos mais difíceis enquanto ministro e da satisfação de dever cumprido. Fernando Teixeira dos Santos é o homem que no golfe e na vida marca com smiles as bolas que bate, para nunca se esquecer de que tudo depende do esforço e da persistência empregues em cada ato.

Há quanto tempo pratica golfe?
Faz agora dois anos e meio que comecei a jogar. O meu amigo Hernâni Teixeira andou muitos anos a tentar convencer-me, mas eu achei sempre que não tinha vida para isso e confesso que via a modalidade na televisão e não achava grande graça. Quando saí do Governo, ele continuou a insistir comigo e houve um dia em que sucumbi à pressão (risos). É de facto um vício. Dos bons.

Que lições de vida se tiram do golfe?
Em primeiro lugar, que as coisas dependem muito de nós. Em segundo lugar, nem sempre correm bem, e portanto é preciso conviver com a adversidade. E, em terceiro lugar, aprendemos que se agora não correu bem da próxima vai correr melhor.

Considera-se um homem ambicioso?
Se se definir ambição por se querer fazer mais e melhor sempre, sim, nesse sentido sou ambicioso.

A vida tem correspondido às suas expectativas?
Tem. Felizmente, chegando a esta fase da minha vida, não considero que tenha razões de queixa. Sinto que tenho conseguido evoluir, quer em termos pessoais, quer em termos profissionais e, no geral, as coisas que tenho feito deixaram-me satisfeito. Mesmo em tempos difíceis, em que nem tudo correu bem, em que eu gostaria que as coisas tivessem corrido de outra maneira, procurei sempre dar o melhor de mim e fazer o melhor possível, dadas as circunstâncias.

Ter de pedir ajuda financeira para Portugal foi um desses momentos difíceis?
Sem dúvida, sem dúvida! Passámos momentos de muita dificuldade. A conjuntura internacional era muito complicada. A percepção de que o financiamento, quer do Estado, quer da Banca, se estava a tornar cada vez mais difícil, na situação em que então vivíamos, aconselhava a que não corrêssemos mais riscos. Não podíamos depender exclusivamente do financiamento do mercado porque era muito difícil e daí a necessidade de termos de solicitar ajuda a instituições internacionais, neste caso a nível europeu e também ao FMI (Fundo Monetário Internacional). E, como pudemos ver posteriormente, estas situações colocam sempre o país numa tutela externa que é politicamente incómoda e que, de alguma forma, fere o nosso sentido de soberania e de autonomia, do ponto de vista político e nacional. É sempre muito gravoso e nunca é uma decisão fácil, daí que há sempre muita resistência a tomar-se uma decisão dessas, porque é algo que só se decide in extremis

Isso fez com que tivesse algumas noites mal dormidas?
Sim, foram noites difíceis, sem dúvida, muita ponderação, mas a decisão teve de ser tomada e não estou arrependido. Estou convencido de que se o país não tivesse tomado aquela decisão, na altura, hoje estaria numa situação bem mais complicada.

Como ficou a sua relação com José Sócrates, depois disso?
Passou a ser uma relação distante. Na altura, ele tinha a percepção das dificuldades e das implicações da decisão, daí que tenha resistido. Não foi algo que lhe agradasse e que afectou a nossa relação pessoal, que depois foi melhorando com o tempo. O tempo ajuda sempre a ultrapassar e a olhar para as coisas de forma diferente. Mas já não falo com ele há muito.

É alguém que stressa com facilidade?
Sofro a pressão das situações, mas não stresso. Tento manter a calma, não costumo perder a cabeça e tenho consciência de que isso também não resolve. Os momentos complicados exigem muito de nós e não é perdendo a compostura que contribuímos para resolver as coisas. Em momentos difíceis, quando as pessoas que estão a trabalhar connosco sentem que, quem lidera, começa a perder a cabeça, ficam afectadas. Portanto, nós temos de dar um sinal de confiança, de ponderação, de que estamos sob controlo, e essa é a melhor forma de elas poderem responder.

Mas José Sócrates é alguém que tira as pessoas do sério?
Às vezes. (sorriso)

Ficou surpreendido com o convite para ser Presidente Executivo do BIC Portugal? Porque decidiu aceitar?
Nunca deixa de ser uma surpresa. Decidi aceitar porque é uma área de atividade com a qual tenho contactado, há já muitos anos, quando fui secretário de Estado do Tesouro, quando estive na CMVM (Comissão do Mercado de Valores Mobiliários), como ministro acompanhei sempre a situação do sector financeiro, e em particular da Banca. Em segundo lugar, porque acho que é um desafio interessante, por duas razões: primeiro, porque se trata de uma instituição relativamente jovem no panorama do sistema bancário português, por isso, tem ainda de fazer um esforço para ganhar o seu espaço e para se afirmar; em segundo lugar, porque é um desafio que ocorre numa conjuntura particularmente difícil para a banca em geral, como temos vindo a ver. Portanto, não vai ser uma tarefa fácil, tenho consciência disso, mas também já me habituei a enfrentar alguns cenários difíceis. O desafio, quer pela instituição em si, quer pelo contexto que nos rodeia, vai exigir um esforço muito grande em termos de trabalho de equipa. E eu espero ser capaz de liderar a equipa que vai estar à frente do BIC.

Não vê nenhum conflito de interesses pelo facto de ter tido um papel na nacionalização do BPN?
Não há qualquer conflito de interesses, até porque eu nunca estive ligado à administração do banco, só tive de tomar uma decisão política na altura, numa situação de grande dificuldade, em particular do então BPN, que era um risco sério para a estabilidade do sistema financeiro. Não fui eu o responsável pela alienação do BPN ao BIC. Não estive envolvido neste processo, portanto, não sinto qualquer conflito de interesses.

Porque é que, na altura, o Governo se comprometeu a vender o BPN, num curto espaço de tempo, quando sabia que tal iria ser difícil?
O que aconteceu foi termos a preocupação de cumprir um compromisso que foi assumido. O BPN foi nacionalizado para evitar o agravamento da situação financeira. Nós nacionalizámos para rapidamente devolver o banco ao sector privado. Nem sempre é fácil fazer a venda de um banco. Vender, e vender dentro do prazo, só para cumprirmos um calendário a que nos auto-impomos, arriscando a fazer uma venda má, não faz sentido, e por isso mesmo há que esperar por condições mais favoráveis para a alienação de uma entidade financeira, como foi o caso do BPN e como é atualmente o caso do Novo Banco.

Mas então porque se comprometeram na altura?
É evidente que o BPN é nacionalizado, mas não é para ficar no sector estatal, era o sinal político que se queria dar. Nós não estávamos a entrar numa onda de nacionalizações em que o Estado ia ficar com o sistema financeiro ao seu colo. Não. Daí a necessidade de se dizer: nós nacionalizámos, mas vamos privatizar. O Estado não quer ser o dono da banca e era esse sinal político que se queria dar.

«Espero ser capaz de liderar a equipa que vai estar à frente do BIC»

«Tenho a ideia de que, de uma forma geral, as pessoas me respeitam»

Um comentário sobre a polémica das viagens pagas pela GALP aos secretários de Estado.
Acho que é evidente que o exercício de cargos públicos exige sempre uma postura de grande transparência, de independência e de distanciamento e creio que este episódio revela isso.

E sobre a forma como se sanou o problema?
Penso que é importante haver um código de conduta? Independentemente de tudo o que foi dito e feito, na sequência disso, não se elimina a criação de um facto político que tem de ser enfrentado pelo Governo, no meu entender. 

Considera que este caso foi bem gerido?
Acho que foi gerido da forma possível.

Como avaliaria o atual Governo?
A ideia que tenho é que, apesar de tudo, o Governo tem vindo a ser capaz, no essencial, de respeitar as promessas eleitorais que fez, de responder aos desafios exigentes da nossa participação na moeda única, sem romper com os partidos de esquerda, que são críticos como sabemos e, até em algum sentido, anti-europeus. E tem conseguido manter um equilíbrio que tem muito a ver com uma habilidade política ímpar do Primeiro-Ministro em gerir esta situação. Mas o Governo tem ainda desafios importantes pela frente, designadamente no domínio orçamental. Teve uma vitória importante, com a questão das sanções, mas o desafio maior vai ter a ver com a execução orçamental deste ano e a proposta de orçamento para o próximo ano. E se a resposta a estas duas questões for adequada, o Governo consegue reforçar a sua confiança e a sua base de apoio.

Que metas ainda quer alcançar? Onde se vê daqui a cinco ou dez anos?
Vou fazer 65 anos e tenho este desafio do BIC, no qual estou concentrado. Não estou a pensar em mais nada. Estarei aberto, havendo saúde e disponibilidade, para enfrentar outros desafios, mas não é algo que me preocupe. Acho que já fiz o meu percurso e sinto-me já muito numa ponta final desse percurso.

Em que medida as suas paixões se têm enquadrado no seu trabalho?
A minha grande paixão é a família. Procuro sempre manter a proximidade com eles, apesar de ela estar no Porto e de eu ter de trabalhar em Lisboa. Agora que tenho três netos quero vê-los crescer e poder estar com eles. Também tenho um bom grupo de amigos e gostava de continuar a conviver com eles. Acima de tudo, para mim, isso é o que fica. Nós andamos por muito lado a fazer muita coisa, mas ao fim do dia, se pensarmos bem, é isto que temos. É a família, são os amigos e é o podermos desfrutar do prazer que isso nos pode dar. Procurarei sempre manter esta reconciliação entre a vida profissional exigente e esta frente que não pode deixar de ser também exigente. E nunca pensei, nem pensarei, sacrificar aquilo que para mim é mais importante pela vida profissional, isso não.

Já foi um dos políticos do nosso país. Sente que as pessoas foram justas consigo, que souberam perceber a dificuldade do seu trabalho?
Eu acho que sim. Não me posso queixar. A generalidade das pessoas percebeu as dificuldades que o país enfrentava, as dificuldades que a governação enfrentava, as dificuldades que eu, pessoalmente, enfrentava. É evidente que há, como é natural, divergências de opiniões e isso é de salutar e não me sinto penalizado pelo juízo que possam fazer. Haverá, com certeza, quem ache que eu não fiz, ou devia ter feito mais do que fiz; outros acham que eu fiz o que era adequado e que fiz muito bem. Convivo bem com essas opiniões. O viver em democracia é isso mesmo: saber coexistir com essas divergências, que obviamente marcam muito a nossa imagem pública. Mas acho que não tenho razões para me sentir maltratado. Tenho a ideia de que, de uma forma geral, as pessoas me respeitam.

É um homem feliz, realizado e de bem com a sua consciência?
Sim e gosto de estar também de bem com as outras pessoas, embora enfrentando os confrontos que muitas das vezes temos de enfrentar. Até para estar de bem comigo, não é? Porque acima de tudo quero estar de bem comigo.

«Uma situação complicada exige muito de nós e não é perdendo a compostura que contribuímos para resolver a situação»

Filomena Abreu
T. Filomena Abreu
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